"a única verdade é que vivo. Sinceramente, eu vivo. Quem sou? Bem, isso já é demais...." Clarice Lispector
15 de abr. de 2008
Desenhando no fundo do espelho...
Fruto de enganos ou de amor,nasço de minha própria contradição.O contorno da boca,a forma da mão,o jeito de andar(sonhos e temores incluídos)virão desses que me formaram.Mas o que eu traçar no espelho há de se armar também segundo o meu desejo.Terei meu par de asas cujo vôo se levanta desses que me dão a sombra onde eu cresço-como,debaixo da árvore,um caule e sua flor.A marca no flanco.O mundo não tem sentido sem o nosso olhar que lhe atribui forma,sem o nosso pensamento que lhe confere alguma ordem.É uma idéia assustadora:vivemos segundo o nosso ponto de vista,com ele sobrevivemos ou naufragamos.Explodimos ou congelamos conforme nossa
abertura ou exclusão em relação ao mundo.E o que configura essa perspectiva nossa?Ela se inaugura na infância,com suas carências nem sempre explicáveis.Mesmo se fomos amados,sofremos de uma insegurança elementar.Ainda que protegidos,seremos expostos a fatalidades e imprevistos contra os quais nada nos defende.Temos de criar barreiras e
ao mesmo tempo lançar pontes com o que nos rodeia e o que ainda nos espera.Toda essa trama de encontro e separação,terror e êxtase encadeados,matéria da nossa existência,começa antes de nascermos.
Lya Luft